O transporte de oxigênio, e a concentração é, talvez, mais importante que o número global de eritrócitos ou de hemoglobina. O volume total do sangue tende a se manter dentro de limites estreitos por uma variedade de mecanismos fisiológicos. Entretanto, nos estados em que o volume sanguíneo se afasta do normal, como na superhidratação, desidratação, retenção líquida ou nas grandes perdas de sangue, as medidas usuais de concentração podem ser ilusórias. Um aumento de volume plasmático pode dar a impressão falsa de anemia. Na atualidade, a realização do hemograma é eletrônica, através do contador Coulter, exceto a interpretação citomorfológica do esfregaço sanguíneo (que é realizada no microscópio, e, certamente, exige grande competência anátomo-patológica do profissional). Tudo é exato no Coulter, desde que o instrumento esteja calibrado e em bom estado de conservação. Isto, às vezes, é um problema no interior do Brasil com menor assistência técnica. Nos indivíduos normais, os eritrócitos são produzidos pela MO (medula óssea) e liberados na circulação, onde sobrevivem cerca de 120 dias. No adulto, quando o fígado volta a produzir sangue, e ineficiente, é uma doença chamada metaplasia mieloide agnogênica. Voltando, ao tempo de vida dos eritrócitos, com média de 120 dias, em seguida são removidos pelo sistema reticulo-endotelial, no qual a Hb é fragmentada em pigmentos biliares, ferro e globina. Lembrando, que a hemácia é um corpúsculo que na ausência de núcleo vai perdendo, progressivamente a capacidade de renovação do seu mosaico fluido e, desta feita, de se mover com integridade dentro dos capilares. Esses capilares são, principalmente, os do baço. A hemocaterese (destruição das hemácias) ocorre na polpa vermelha do baço, que contém cordões de Billroth e seios venosos. O seios venosos são vasos por onde as hemácias circulam e os cordões de Billroth são células de defesa, principalmente leucócitos e células dendríticas. Os linfócitos predominam na polpa branca formada pelos nódulos linfáticos (com centro germinativo de Flemming contendo linfoblastos, e coroa com linfócitos). É evidente que o volume da massa de eritrrócitos circulantes está relacionado aos índices de produção e destruição. No indivíduo normal, os dois índices são iguais; por conseguinte, a massa de eritrócitos permanece constante em volume, e diz-se que a pessoa está em equilíbrio hematológico. Quando a destruição excede a produção, a massa de eritrócitos decresce em volume instalando-se a anemia. Quando a produção excede a destruição, a massa de eritrócitos aumenta, é o que ocorre no tumor de células vermelhas da MO, chamado policitemia vera. O hormônio eritropoietina é uma glicoproteína que se acredita formada pela ação de uma enzima no rim – fator eritropoiético renal ou eritrogenina – que reage com uma substância plasmática (eritropetinogênio) de origem hepática. O rim, entretanto, na maioria das espécies (inclusive no homem) não é a única fonte de eritropoietina; a remoção dos rins não só não anula a eritropoiese como não causa o desaparecimento completo da atividade da eritropoietina no plasma. A hipóxia tissular é o último estímulo para a produção de eritropoietina. Além de induzir hiperplasia dos precursores eritrocíticos, a secreção de eritropoietina encurta o tempo de geração dos eritrócitos, provoca desnucleação prematura e faz com que os reticulócitos sejam liberados do sangue em fase mais precoce da maturação que normalmente (“reticulócitos em desvio”). Como a Hb constitui cerca de 90% do peso seco das hemácias, a produção desses glóbulos está muito implicada na síntese da Hb. A Hb tem a capacidade de fixar reversivelmente o O2. É um composto de peso molecular de 64,458, constituído por uma proteína incolor (globina) e um grupo prostético, o heme (o ferro e a protoporfirina 9, tipo III). A exemplo de outros anéis de porfirina, ele consiste em quatro núcleos pirrol conectados entre si por pontes de meteno. Os materiais – fonte para formação da porfirina são o aminoácido e a succinil-coenzima A, que se origina do ciclo do ácido tricarboxílico. Estudos in vitro e in vivo esclareceram as fases do processo sintético. O acetato é transformado em alfa-cetoglutarato, e esse, em presença da coenzima A, dá origem ao succinil CoA. Esse é o ponto que o ácido pantotênico funciona na eritropoiese, uma vez que essa vitamina é um componente da CoA. A piridoxina entra na fase seguinte. A forma ativada de succinato condensa-se com um complexo piridoxalfosfato-glicina para formar o ácido deltaminolevulínico (delta-ALA) e CO2. Duas moléculas de delta-ALA condensam-se para formar um monopirrol, que é o porfobilinogênio. As fases subsequentes levam a formação de protoporfirina. A protoporfirina é convertida em Hb na presença de ferro, globina e uma enzima, a sintetase heme (ferroquelatase). Os principais fatores essenciais à sobrevivência dos eritrócitos são:
1. Uma fonte de energia;
2. A capacidade de manter um teor líquido eletrolítico estável;
3. Um sistema que o proteja dos oxidantes exógenos e endógenos.
A membrana tem a propriedade de permeabilidade seletiva, sendo capaz de facilitar a passagem de cátions contra um gradiente iônico. Essa função é exercida por uma “bomba” que permuta o sódio intracelular por potássio extracelular. A bomba utiliza ATP, exige a presença de uma enzima (ATPase) e é inibida in vitro por glicosídios cardíacos. Os principais componentes que protegem da oxidação o eritrócito e seu conteúdo, são os seguintes: glutatião, a nucleotídeo-trifosfopiridina reduzida (TPNH, NADPH), e as enzimas glicose-6-fosfato-desidrogenase, glutatião-redutase e glutatião-peroxidase. Ao terminar seu ciclo vital, o eritrócito é removido por componentes do sistema reticulo-endotelial, principalmente pelo baço. O ferro e os aminoácidos são extraídos e re-utilizados. A maior parte do ferro liberado é transportado como “ferro plasmático” pela proteína de transporte transferrina, uma beta 1-globulina, para a MO, onde é utilizado na síntese de nova Hb. Parte do ferro é retida na célula reticulo-endotelial como ferritina, complexo ferro-férrico-proteico ou como hemossiderina, forma mais estável e mais rara de armazenamento do ferro. A globina liberada degrada-se e retorna à mistura de Aas (aminoácidos). O anel porfirina é convertido em pigmentos biliares que são excretados. O monóxido de carbono é um subproduto dessa reação, servindo sua medida como um índice útil da taxa de destruição eritrocítica. Em determinados estados patológicos, a Hb poderá passar para a circulação, colorindo o plasma de rosa desmaiado ou vermelho vivo, dependendo da concentração. Essa Hb plasmática pode ser medida quantitativamente pela reação de benzedina. Isto pode ocorrer em graves estados hemolíticos, com hemólise intravascular, como na eritroblastose fetal, nas reações hemolíticas graves da transfusão, etc. Certas globinas que têm afinidade pela Hb, as haptoglobinas, fixam-na imediatamente ao ser liberada, ela é, então, transportada para as células do parênquima hepático para ser fragmentada e convertida em bilirrubina. As haptoglobinas plasmáticas podem fixar geralmente 40 a 200mg de hemoglobina por 100ml de plasma. O epitélio tubular renal (epitélio cúbico simples) converte a hemoglobina (Hb) em hemossiderina que é encontrada regularmente na urina de pacientes com uma concentração baixa de pigmentos heme no plasma. A passagem de Hb pelo rim é acompanhada por proteinúria, cilindros e precipitados de Hb. No intestino a bilirrubina é convertida e urobilinogênio e coproporfobilinogênio. O urobilinogênio consiste em uma série de cromogênios incolores, todos caracterizados por uma forte reação no aldeído de Ehrlich. A transição para urobilina pode ser acelerada por agentes oxidantes, como o iodo, sendo essa a base do teste qualitativo de Schlesinger para urobilina. A quantidade de urobilinogênio excretada pela urina, em 24 horas, pelo adulto normal, é de 0 a 3,5mg. A variação para o urobilinogênio fecal é de 40 a 280mg/dia. O uso do antibiótico, tetraciclina (de uso, hoje, raro), produz acentuado decréscimo na concentração de urobilinogênio fecal.
CLASSIFICAÇÃO ETIOLÓGICA DAS ANEMIAS
1. Hemorragia
1.1. Hemorragia recente (Aguda);
1.2. Hemorragia persistente (Crônica).
2. Excessiva destruição de eritrócitos
2.1. Fatores Extracorpusculares
A. Anticorpos
B. Medicamentos, agentes físicos e químicos
C. Traumatismo físico em eritrócitos
D. Sequestração (especialmente no baço – hiperesplenismo)
2.2. Fatores intracorpusculares
A. Hereditários (Desordens da glicólise; Síntese defeituosa do glutatião reduzido; Anomalias na síntese de globina; Anomalias da membrana eritrocítica);
B. Adquiridas (Carência de ferro, vitamina B12 ou folatos)
3. Produção insuficiente de eritrócitos maturos
A. Carência de nutrientes essenciais (Ferro, B12, ácido fólico; Proteína; Possivelmente ácido ascórbico; experimentalmente, cobre, cobalto, piridoxina, ácido nicotínico, riboflavina, ácido pantotênico e tiamina;
B. Deficiência de eritroblastos
1. Atrofia da MO (agentes físicos ou químicos; hereditária; idiopática=de etiologia desconhecida);
2. Aplasia pua dos eritroblastos
C. Infiltrações da MO (Leucemia, linfoma, carcinoma, sarcoma, etc,)
D. Doenças endócrinas (Mixedema do hipotireoidismo, doença de Addison, insuficiência hipofisária, etc.)
E. Nefropatias crônicas;
F. Doenças inflamatórias crônicas (infecções, doenças auto-imunes, etc.);
G. Hepatopatias
Quando a perda sanguínea é aguda, a causa da anemia é óbvia. A perda crônica de sangue ocorre mais comumente dos órgãos pélvicos, na mulher, e do tubo digestivo no homem. Uma causa usual de anemia crônica é a infestação pelos nematoides (parasitas intestinais = “vermes”). Na anemia da insuficiência renal, ainda não foi devidamente esclarecida a natureza desses fatores; não há evidência de mecanismo auto-imunitário, como não há relação alguma com os produtos retidos na insuficiência renal. Pode haver fatores mecânicos com distorção ou fragmentação dos eritrócitos com lesão dos vasos (anemia microangiopática). Nas hepatopatias, pode haver perda sanguínea por rompimento de varizes esofagianas (hipertensão portal); carência de ácido fólico nos alcoólatras, mas, muitas vezes, a causa é obscura. Para o aparelho cardiovascular, há uma reduzida capacidade transportadora de O2, na anemia. O aumento do fluxo sanguíneo é realizado pelo aumento do volume sistólico e ritmo cardíaco. Pode ocorrer palpitações, taquicardia, aumento da pulsação precordial e nas grandes artérias, decresce a tolerância ao exercício, cansaço fácil, dispneia, até insuficiência cardíaca. O sistema neuromuscular cursa com cefaleia, vertigem, lipotímias, sensibilidade exagerada ao frio, zumbidos nos ouvidos, pontos negros diante dos olhos, miastenia (fraqueza), irritabilidade, delírio é episódio raro. É comum a diminuição ou perda da libido.
É fundamental entender, que a ANEMIA não é uma doença per se, MAS A MANIFESTAÇÃO DE UMA DOENÇA. O médico há que diagnosticar corretamente e tratar a doença responsável. As anemias podem ser: macrocíticas; hipocrômicas e/ou microcíticas; e anemias normocíticas e normocrômicas – referendando a análise citomorfológica.
O VCM = Hematócrito / Hemácias;
O HCM= Hemoglobina / Hemácias;
O CHCM = Hemoglobina / Hematócrito.
Assim, na anemia macrocítica, o VCM e HCM estão aumentados e o CHCM normal.
Na anemia hipocrômica microcítica estão reduzidos HCM e VCM (microcítico) e CHCM (hipocrômica).
CLASSIFICAÇÃO MORFOLÓGICA DAS ANEMIAS
1. Anemia macrocítica
1.1. Megaloblásticas (carência de B12, carência de folatos, anomalias hereditárias na síntese de DNA, anomalias iatrogênicas na síntese de DNA);
1.2. Não Megaloblásticas (Mixedema, hepatopatias, etc.).
2. Anemia hipocrômica microcítica
A. Carência de ferro (perdas sanguíneas crônicas = menstruais, tubo digestivo, verminose, etc.); demandas excessivas (gravidez, crescimento); carência dietética; má absorção (gastrite, pós-gastrectomia, etc.); anomalia genética (talassemia....).
3. Anemia normocítica (perda sanguínea recente, anemias hemolíticas, insuficiência da MO, anemia da insuficiência renal, das endocrinopatias).